Em um mundo que valoriza tanto as conquistas, a competitividade e a expansão, como lidar com os ciclos de contração da vida?
Querida amiga, há muito tempo tenho vontade de escrever para conversar com você sobre esse assunto. Mas, cá entre nós, eu estava respeitando o ciclo de contração e isolamento que tenho vivido no último ano. E posso te dizer? Está sendo difícil pra caramba.
Não foi só a pandemia, antes fosse. Talvez ela tenha deixado tudo mais triste: não foi fácil ver pessoas queridas irem embora. Mas em muitos aspectos acho que ela até ajudou. Porque viver um ciclo de introspeção quando você poderia estar por aí passeando ou viajando deve ser ainda mais complicado. Como eu não tinha essa opção, vivi esse ciclo em sua plenitude, dando-me o direito de ficar bem quietinha.
A natureza é feita de ciclos, já percebeu? O dia e a noite, as marés, as estações do ano, as fases da vida desde o nascimento até a morte. Porém, mesmo sabendo que as coisas funcionam assim, muitas vezes não queremos que esses mesmos ciclos se manifestem em nossa vida. É como se quiséssemos que na nossa profissão, na vida pessoal, nos relacionamentos fosse sempre aquele dia delicioso de verão. Ou fosse eternamente dia, com os raios de sol fazendo nossas conquistas brilharem.
Mas posso te contar um segredo? Todo mundo tem a sua noite também. Seus dias escuros, que podem acontecer quando falta saúde, quando alguém da família está mal, quando você decide que não quer mais o trabalho que tem… Pode ser que a vida te traga esses desafios e você não possa fugir, é possível até que seja uma escolha feita por você, como no meu caso. E nessa hora você vai precisar de uma dose extra de coragem para enfrentar tudo isso.
Não quero que você ache que eu gosto de ficar mal, de sentir dor, nada disso. Porque é claro que eu não gosto. Mas algo que entendi no último ano é que aceitar esse período deixa tudo mais fácil. Ao invés de lutar contra, negar o que eu estava sentindo, eu larguei o corpo e deixei o mar me levar. Eu aceitei que os dias tristes também fazem parte da vida, e pedi que o Universo me levasse para o lugar onde eu seria mais feliz.
Mas, Nívea, por que você quis escrever esse post? Para você, que está vivendo um desses ciclos de contração saber que isso é normal, que não há nada de errado com você. Não há nada de errado em ficar triste, em chorar, desde que essa tristeza tenha fim (porque se não tiver, estamos falando de depressão. Essa sim não é uma condição normal e precisa de tratamento). Para que você saiba que não é todo mundo que está na melhor fase da vida, fazendo os melhores passeios, esbanjando uma conta bancária gorda, com o corpo perfeito e uma pele de pêssego. E está tudo bem que seja assim.
Eu sei que será difícil para você conversar sobre isso, como foi para mim nos últimos meses. Mas se eu puder deixar uma dica é: tenha pelo menos uma pessoa querida e confiável para dividir todos esses sentimentos. Com certeza você se sentirá mais leve, mais amparada.
Agora posso te contar o lado bom de tudo isso? É que quando termina, você está mais forte, ou mais humana, ou mais generosa, ou mais humilde. Você se torna um ser humano melhor, que terá uma vida melhor e espalhará coisas boas ao seu redor.
Eu não gosto do frio do inverno, mas eu sei que ele passa. Quando as primeiras brisas quentes da primavera chegam, eu sei que está acabando. Eu não gosto da escuridão da noite, mas sei que ela acaba. Quando os passarinhos começam a cantar, antes mesmo do primeiro raio de sol surgir no horizonte, eu sei que o dia está começando E esses mesmos indícios eu tenho encontrado na minha vida, nas últimas semanas. Eu sei que o ciclo de contração está terminando: sou muito grata a ele e aos bons ventos da mudança que começaram a soprar.